As implicações de uma espiritualidade profunda
“Peguei o livrinho da mão do anjo e o comi. Ele me pareceu doce como mel em minha boca; mas, ao comê-lo, senti que o meu estômago ficou amargo. Então me foi dito: ‘É preciso que você profetize de novo acerca de muitos povos, nações, línguas e reis’.” Apocalipse 10:8-11
Enquanto pensava no tema da espiritualidade feminina, me deparei com esse texto de apocalipse, que me fez pensar diretamente sobre a nossa espiritualidade. Segundo Richard Bauckham, teólogo Inglês, o livro de Apocalipse de João é uma obra de imenso aprendizado para uma teologia profunda. Eu não sei você, mas na minha adolescência eu tinha muito medo e pouco compreendia desse livro. A medida que fui amadurecendo, meu olhar foi mudando com relação ao que está escrito nele. Hoje ainda tenho que entender, mas o vejo como um livro fundamental para o entendimento da nossa vida cristã, crescimento em santidade e da vitória que é certa para aqueles que foram lavados pelo sangue do cordeiro.
O versículo em questão nos fala de um livrinho com gosto doce como mel na boca, mas amargo como fel no estômago. O que isso pode dizer sobre a nossa espiritualidade?
Primeiro temos que definir o que seja espiritualidade. Segundo a Wikipédia espiritualidade é “propensão humana a buscar significado para a vida por meio de conceitos que transcendem o tangível, à procura de um sentido de conexão com algo maior que si próprio”. Segundo a Bíblia a nossa espiritualidade está relacionada ao conhecimento da palavra e a obediência aos seus princípios.
A maioria de nós cristãos entendemos a importância da Palavra de Deus para o nosso crescimento espiritual, mas muitas vezes damos pouco tempo do nosso dia para nos imergirmos e digerirmos perfeitamente a Palavra. A verdade é que muitos quando começam ler as Escrituras, se apegam somente as partes boas das promessas, as verdades da salvação, tudo parece como mel e amamos ler tudo isso. Mas quando começamos a estudar mais profundamente as implicações para que as promessas sejam cumpridas, vemos o quanto amargo isso pode ser.
A Palavra de Deus nos foi escrita para que entendamos a soberania e governo de Deus sobre todas coisas e que Ele, como Deus, tem um propósito singular, que temos o privilegio de participar, que é fazer seu nome ser adorado e engrandecido em nossa vida e em todas as nações, além de também nos mostrar quem somos e o quanto carecemos do Seu amor e graça em nossa vida.
A grande questão é que para participarmos desse propósito do Senhor, precisamos conhecê-lo e ser moldados por ele, o que se torna amargo na maioria das vezes para nós. Pois temos que renunciar o nosso “EU”, tomar a nossa cruz e seguir os passos de Jesus quando ele mesmo disse: Se alguém quer vir após mim, A SI MESMO SE NEGUE, tome a sua cruz e siga-me. (Lucas 9:23)
Crescer em nossa espiritualidade independe do conhecimento intelectual que temos da Bíblia, mas depende de, à luz da sua Palavra, renunciarmos os nossos desejos e pensamento, nos tornando barro para sermos moldados conforme os desejos e pensamentos do Senhor e não os nossos.
Conhecer ao Senhor e viver para glória dele, dependerá de muita renuncia nossa. Você já avaliou o seu coração para ver o quanto do seu “eu” ainda permanece resistente nas suas atitudes, palavras e ações?
Gosto de passear na leitura da Bíblia e ver Deus me mostrando através da sua Palavra o quanto pecadora e carente de sua transformação eu sou. A Bíblia é clara em nos mostrar que o nosso coração é enganoso como diz Jeremias 17:9-10 “Enganoso é o coração, mais do que todas as coisas, e desesperadamente corrupto; quem o conhecerá? Eu, o SENHOR, esquadrinho o coração, eu provo os pensamentos; e isto para dar a cada um segundo o seu proceder, segundo o fruto das suas ações”.
A Bíblia nos afirma que se confiarmos no nosso eu, no nosso coração enganoso, naquilo que pensamos, achamos e queremos, vamos estar sempre insatisfeitas, buscando nas coisas e pessoas que nos rodeiam, e até mesmo na nossa missão, algo que preencha o nosso vazio existencial. Vazio esse que só pode ser preenchido pela satisfação completa em Jesus, como afirma o John Piper em muitos dos seus livros e sermões.
Li recentemente um livro onde o autor colocou algo bem interessante, sobre a nossa responsabilidade no processo de santificação, que as vezes por mais que saibamos sobre isso nos esquecemos de colocar em pratica. Ele nos lembra em seu livro que a salvação é algo que só Deus pode fazer, não existe participação humana nisso. É um ato único e somente Deus pode agir. Mas ele fala que ao contrário da salvação a santificação é algo que, com certeza, vem de Deus, mas que nós temos uma certa participação nesse processo. Paulo confirma isso em Cl 1:29 onde ele diz: “é para esse fim que eu ME EMPENHO, ESFORÇANDO-ME o mais possível, segundo o poder de Cristo que opera poderosamente em mim”. Paulo mostra que abandonar o eu, deixar os desejos do nosso coração, é sim pelo poder de Deus, mas que isso não tira de nós a responsabilidade de lutar contra a nossa natureza pecaminosa para a mudança, quando ele usa verbos como “me empenho e esforçando-me o mais possível”.
A Bíblia é recheada de exemplos de homens que se encheram do seu “EU” e acabaram esquecendo do seu Criador. Um bom exemplo disso foi Salomão que com toda sua sabedoria, dada por Deus, acabou caindo nos enganos do seu coração. O próprio Salomão escreveu textos como Prov 20:5 que diz: “Os propósitos do coração do homem são águas profundas, mas quem tem discernimento os traz à tona”, e Prov 6:12-19 (leia na sua bíblia), para nos mostrar o quanto nosso coração é profundo, obscuro, enganoso, calculista e indigno de confiança. Salomão apesar de toda sua sabedoria, se deixou levar pelos desejos mais profundos do seu coração, alimentados pela natureza carnal. Mas no fim da vida, como escreveu o Pr David Gibson em seu artigo, Salomão volta-se para o Senhor e escreve o livro de Eclesiastes, nos mostrando que toda e qualquer coisa que tentamos nos agarrar neste mundo como se fosse algo eterno escorrerá por entre nossas mãos, seja eu mesma, família, ministério etc. Nada pode ocupar o lugar de Deus em nossa vida. Salomão nos ensina nesse livro sobre a brevidade da nossa vida, nos monstrando como a vida é recheada de dias bons e dias ruins, de correria, ilusões, decepções, pois o pecado trouxe desordem para o nosso dia a dia. Mas a medida que lemos as sagradas escrituras podemos ter a mesma certeza de Paulo em Hebreus 10:22-23, “Assim, aproximemo-nos de Deus com um coração sincero e com plena convicção de fé, tendo os corações aspergidos para nos purificar de uma consciência culpada e os nossos corpos lavados com água pura. Apeguemo-nos com firmeza à esperança que professamos, pois aquele que prometeu é fiel”.
Para crescermos em espiritualidade e mantermos um coração puro precisamos ter uma interpretação cuidadosa da Palavra de Deus, e uma boa interpretação do nosso coração com relação aos nossos reais desejos e motivações.
Será que estamos prontas para sondar o nosso coração, desejos e pensamentos a luz da Bíblia e nos empenharmos para fazer as transformações necessárias e muitas vezes doloridas em nossa vida, ou temos guardado a sete chaves pequenos pecados que tem nos impedido de chegarmos mais perto do caráter de Jesus?
Qual tem sido o desejo do nosso coração que tem nos aprisionado e impedido de crescermos em santidade diante de Deus? Jesus nos exorta em Mateus 15:18 assim: “Mas o que sai da boca vem do coração e é isso que contamina o homem”. Você já percebeu que os conflitos que enfrentamos nascem dos nossos desejos?
Assim, a medida que nos aprofundamos nas escrituras, cuidadosamente, verificando o nosso coração, o que pode ser muito amargo e dolorido, conseguimos crescer em espiritualidade, conhecendo o Deus soberano que governa as grandes e imponentes coisas dos universo, como também governa, se preocupa e cuida de seres pequenos e desprezíveis como nós, nos mostrando na sua palavra as mudanças dolorosas que precisamos fazer no nosso coração para buscarmos a santificação sem a qual ninguém verá ao Senhor como diz Heb 12:14, 15. E assim podermos orar a Deus como Jesus orou: “Meu Pai, se possível, passe de mim este cálice! Todavia, não seja como eu quero, e sim como tu queres” Mateus 26:39b. Jesus é o nosso alvo maior, que Ele nos ajude a permanecer firmes e cumprir a sua vontade quando o amargor chegar nessa dolorosa caminhada da santificação.
Referências:
Pr David Gibson https://voltemosaoevangelho.com/blog/2023/11/eclesiastes-tudo-e-realmente-vaidade/
Edward T. Welch Habitos escravizadores – Encontrando esperança no poder do evangelho.
https://pt.wikipedia.org/wiki/Espiritualidade
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