Depressão ou demônio?

Sofrendo de depressão e sendo tratada como pecadora

Testemunho impactante de uma mulher que lutou com todas suas forças contra a depressão

Talvez estejam se perguntando o porquê deste título. Eu sou obreira servindo entre culturas a 23 anos na África Oeste. Quero compartilhar com vocês a minha história de início de caminhada no trabalho transcultural.
Cheguei solteira nesse país, mas após dez meses conheci meu esposo. Ele era um brasileiro que residia nos EUA e estava visitando o campo, e acabamos nos casando apenas sete meses após nos encontrarmos pela primeira vez. Parece loucura, mas vemos que tudo isso fazia parte dos planos do Senhor para nossas vidas.

Nessa época, nenhum de nós tínhamos muita experiência. Tudo o que queríamos era trabalhar para o Senhor. Então depois de três meses que casamos no Brasil, retornamos ao Senegal, enviados pela igreja de meu esposo para trabalhar com uma família ligada a uma outra missão. A priori, tudo parecia ir muito bem, até notarmos que nosso parceiro de ministério não era sincero conosco nem com a nossa igreja. Eu creio que foi a partir dessa situação com os colegas de trabalho que a minha insatisfação se deu início. Assim, aos poucos eu passei a não conseguir me alimentar e nem dormir direito, e também comecei a ter episódios de muito choro e tristeza. Além disso, morávamos em uma aldeia sem luz elétrica e nem água encanada, sendo que o poço ficava a cerca de quinhentos metros de nossa casa. A vida cotidiana se mostrava cada vez mais complicada para nós.

“Missionário não pode ter depressão” – Foi o que disseram

Ao entrarmos em contato com o nosso pastor, fomos apenas aconselhados a orar mais. Ele alegava que a culpa era minha de estar me sentindo tão mal, e que eu provavelmente estaria com problemas espirituais. Na busca por mais respostas, fomos para a capital (Dakar) procurar um médico. Encontramos um professor universitário que me diagnosticou com problemas neurológicos. Tomei inúmeros remédios, sempre confiando naquilo que o doutor nos dizia. Assim, decidimos voltar para a aldeia, onde havíamos desenvolvido um trabalho bem sólido com as crianças. Nossos corações ansiavam em voltar a servir naquele lugar.

Continuávamos tentando e nos esforçando, pois aquele era realmente o nosso chamado! E embora estivéssemos dando o nosso melhor, eu ainda não me sentia muito bem, o que fazia o nosso pastor insistir que eu provavelmente estava com problemas de ordem espiritual. Aprendemos assim, a duras penas, que é muito complicado receber suporte de alguém que não conhece a realidade do campo.
Meses mais tarde, sem nenhuma melhora e sem saber o que realmente estava acontecendo, percebemos que precisávamos de mais ajuda. Guiados pelo Espírito de Deus, meu esposo tomou a decisão de me levar mais uma vez para Dakar, e se necessário até mesmo sair do Senegal. Eu não queria, pois sentia como se estivéssemos sido derrotados no campo. Por fim, deixamos tudo na aldeia e fomos para uma base da nossa organização na capital, preparada por Deus para o nosso cuidado, onde tudo começou a ser esclarecido.

Incompreensão sem medida

Naquele santo lugar havia uma médica brasileira vindo de Guiné Bissau, a qual aguardava seu vôo para o Brasil. Ao ver o meu estado de fraqueza, perguntou-me se eu sabia o que eu tinha. Eu disse que não, e ela sugeriu que fizéssemos o teste de malária. Estranhei, pois não tinha sintoma algum da doença. Para a minha surpresa, o resultado deu positivo. A partir disso, descobrimos que já fazia muito tempo que o vírus estava no meu corpo. A doutora, experiente, perguntou-meu se eu estava grávida. Respondi que seria improvável.
Começamos então o tratamento. Contudo, como eu estava muito magra, logo vi minha barriga começar a crescer. Fomos ao médico, o qual me diagnosticou com um mioma no útero e me disse era impossível eu estar gestante. Decidi, mesmo assim, fazer um exame de sangue, onde pude ver que eu realmente estava grávida. Retornamos ao doutor, só para ouvir que, possivelmente, a gestação não iria para frente. Eu perdi o chão.
Para piorar, nossa igreja dos EUA acabou cortando nosso sustento pois acreditavam que eu estava com problemas espirituais. Meu esposo precisou fazer-lhes uma visita, ao menos para remediar a situação e também arrecadar fundos para que eu pudesse ir para o Brasil. Mesmo que hoje eu saiba que o Senhor estava comigo, naquela época eu não conseguia senti-lo.
Logo em seguida e comecei a sangrar e fui orientada pelo médico a caminhar até que eu abortasse o bebê. Depois de muita confusão, ele precisou viajar e pediu que eu fosse acompanhada por um colega seu, o qual decidiu me examinar melhor. Assim, conseguiu ver que eu estava grávida de gêmeos e que apenas uma placenta estava havia se rompido (de onde saía o sangue). Para a surpresa de todos, o segundo bebê parecia se desenvolver de forma normal.
Então finalmente eu pude partir para o Brasil. Eu estava muito contente em ir para casa, mas confesso que essa foi a pior viagem da minha vida. Ao chegar, minha família ficou muito feliz em me receber e assustada demais com a minha aparência. Levaram-me sem demoras a uma consulta médica, onde constatamos que o segundo feto também já estava sem vida. E o meu estado geral só piorou quando o medicamento para expelir o bebê não funcionou e precisei ser submetida a uma curetagem.

Por fim, o diagnóstico

O período que seguiu todos esses acontecimentos foi muito difícil. A depressão se instalou de vez e tínhamos a impressão de que eu jamais iria conseguir me reerguer. Minha família se fez muito presente e apesar de todo o carinho, eu me sentia oca. Honestamente, parecia que eu não tinha mais nenhum sentimento dentro de mim. Meu irmão, que também era médico, receitou-me um remédio para me ajudar a dormir. No entanto, minha mãe (mãe do coração) logo viu que eu precisava realmente de uma ajuda especializada.
Procuramos então uma psiquiatra amiga da nossa família. Ela até conseguiu me ajudar, mas o fato de não acreditar em Deus complicava tudo. Seus questionamentos em relação à tudo o que eu vivia e ao meu próprio casamento me perturbavam muito. Ainda assim, esse era o recurso que tínhamos disponível na época. Eu tentava lutar, tomava os remédios e ia para as consultas sempre acreditando que o meu Deus viria ao meu auxílio e que ele iria me tirar dessa situação.
Depois de um ano e oito meses de tratamento, consegui sentir-me forte o suficiente para retornar ao campo. Continuei tomando os medicamentos por ainda dois anos, e só parei quando percebi que estava melhor. Para a nossa alegria, depois de três anos o Senhor nos agraciou com um filho lindo e saudável.
Ainda estou no campo e vejo claramente que Deus sempre esteve ao meu lado. Contudo, depois de toda essa experiência e de todo esse tempo, tenho a consciência de que sempre precisarei estar alerta em relação ao meu estado de saúde emocional.

Elza é casada com o pastor Carlos e mãe de Phillipe, está servindo no Senegal desde 1999.

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