A decisão de mudar de país, por mais animadora que seja, traz consigo complexidades que só aparecem no processo. Cada história é única e cada situação familiar tem seus próprios desafios. Mudanças desse porte pedem estrutura e planejamento, principalmente quando há crianças envolvidas.
Quando começamos a pensar e orar sobre a possibilidade de mudar de país, no auge dos nossos 15 anos de casados, meu marido e eu fomos tomados de empolgação. Era algo com que sonhávamos desde o início do nosso relacionamento. Poder servir em outras culturas sempre esteve em nossos corações.
Porém, não tardou para que dúvidas e preocupações tomassem conta de meus pensamentos. A principal preocupação, sem dúvida, era em relação às crianças, na época com 8 e 12 anos. Como seria a aceitação? Seria bom para eles? Como falar sobre a mudança? E se eles não se adaptarem? Esses eram apenas alguns dos meus questionamentos.
Aos poucos, guiados pelo cuidado de Deus, buscando orientação e acompanhamento em várias frentes, criamos um plano de ação que foi sendo ajustado durante o percurso. Hoje, já vivendo em outro país, posso olhar para trás e refletir sobre nossos erros e acertos.
Algumas ações mostraram-se muito positivas para nossa família e fizeram grande diferença, desde a decisão da mudança até a chegada em um novo país.
Compartilho aqui algumas ações práticas que podem facilitar a caminha da sua família nesta aventura:
1 – Organizem a informação antes de passá-la às crianças.
Para facilitar a nossa vida neste momento de tantas decisões, agimos de forma estratégica. Contamos nossos planos para as crianças somente quando nós mesmos já nos sentíamos seguros com a ideia. Além disso, fomos contando gradativamente, em porções de informação que eles pudessem digerir e questionar.
Depois do choque inicial – afinal haviam nascido e morado na mesma casa por toda a vida – as perguntas vieram a galope. Ter calma e clareza como casal e responder em sintonia, fez com que eles se sentissem seguros e amparados, mesmo em meio a negação inicial.
Tenha em mente que todas as dúvidas são válidas. As dores das crianças são reais. Precisamos oferecer a elas a segurança de falarem o que as aflige sem serem repreendidas ou desmerecidas nas suas dores.
Muitas vezes elas não conseguem expressar com palavras o que sentem, ainda assim, precisam saber que estamos juntos e continuamos buscando o melhor para a família.
2 – Não tentem fazer tudo sozinhos.
Logo no início desta caminhada, ficou claro que não conseguiríamos (e nem queríamos) resolver tudo sozinhos. É importante entender que uma mudança de país, seja pelo motivo que for, envolve várias áreas da nossa vida: física, espiritual, emocional, financeira, logística, etc.
Conversamos com as pessoas que faziam parte da vida dos nossos filhos e compartilhamos as nossas necessidades.
A escola nos ajudou a prepará-los para a transição no ensino. Os professores demonstraram interesse e curiosidade e os colegas de sala se organizaram para criar memórias e aproveitar bem o tempo e assim amenizar a saudade que já começava a preocupar.
Na Igreja criou-se um interesse natural em incentivar as crianças a compartilharem a evolução da mudança. O interesse dos irmãos alimentou a alegria pela aventura que estava por vir.
Os amigos, os familiares, e até mesmo profissionais, podem ser grandes aliados nesta jornada. Quanto mais apoio as crianças tiverem das pessoas que as amam, mais encorajadas se sentirão.
Vale mencionar aqui, a ajuda fundamental que tivemos da nossa amiga Léa Marcondes que é terapeuta relacional especialista em transculturalidade. Ela nos ajudou a trabalhar de forma intencional os sentimentos e ações como família, antes, durante e depois da transição cultural. Não hesite em procurar ajuda profissional para você e mesmo para seus filhos. Isso pode fazer toda a diferença!
3 – Sonhem juntos e orem juntos
Mudar de país era certamente um sonho nosso, como casal. Mas será que era um sonho dos nossos filhos?
Como família sempre compartilhamos o interesse por outras culturas, idiomas, culinárias diferentes e lugares distantes. Mesmo assim, foi vital sonhar junto com nossos filhos e dar ouvidos aos sonhos deles.
Minha filha queria fazer ginástica artística, meu filho andar de skate. Juntos pesquisamos onde poderiam desenvolver tais atividades no nosso país de destino. Foram horas muito gostosas navegando no Google Maps e conhecendo melhor nossa nova morada. Visualizar nossa vida em outro país se tornou um exercício diário e muito divertido.
Criamos também momentos diários para orar pelos nossos sonhos e planos e alinhá-los com os planos de Deus. Assim, à medida que pequenas coisas iam se concretizando, as crianças começaram a perceber, assim como nós, o agir de Deus, mesmo nos pequenos detalhes.
Isso tudo nos fortaleceu e uniu como família e nos ajudou a passar pelos momentos mais difíceis e desafiadores, pois além de termos uns aos outros, tínhamos a certeza de que Deus estava no controle de tudo.
4 – Inclua as crianças no desapego
Mudança é sinônimo de desapego, tanto material quanto emocional. Para nós foi um dos processos mais longos e trabalhosos. Nosso exercício de desapego começou quase 1 ano antes da mudança em si, foi gradual e paciente. Isso nos permitiu agir sem causar rupturas ou traumas dolorosos.
Na primeira faxina, minha caçula conseguiu se desfazer somente de 2 brinquedos, mesmo sabendo que já não brincava com mais da metade do que tinha no quarto. Meses depois, percebendo o movimento da casa, reduziu por conta própria, sua coleção de bichos de pelúcia pela metade. Ao final, era a mais empolgada e desapegada da família.
Sei que nem sempre temos toda esta antecedência. De qualquer forma é importante que a criança perceba que ela também tem voz durante o processo. Com paciência, deixe-a fazer escolhas, ainda que sejam limitadas, e acolha a frustração, isso ajudará a criança a se sentir mais confortável mesmo tendo que tomar decisões difíceis.
Uma forma de ajudar a criança a desapegar é deixar que ela escolha o destino dos seus pertences. Pode ser o bazar da igreja, uma doação específica para algum parente ou amigo dela. Uma venda de garagem também pode ser usada como incentivo para que a criança administre os recursos obtidos, nesse caso é um ganho duplo: desapego + gestão financeira.
5 – Coloque na mala o aconchego do lar
Quando o espaço da mala é limitado, naturalmente a razão assume o controle. A nossa tendência é levar somente aquilo que nos parece realmente necessário, ou então que será mais caro de comprar no novo país, ou ainda aquilo que não acharemos com facilidade por lá.
No entanto, um bom conselho que seguimos foi: ache espaço para levar algumas coisas que aquecem o seu coração, que representam o seu lar, que são constantes, e que te fazem sentir-se em casa.
Preciso dizer que a maioria delas não tem grande valor monetário. Um boneco já velhinho e rasgado, alguns imãs de geladeira, uma caneca, alguns itens de decoração, brinquedos que nem sobreviverão a mais uma lavagem.
No começo, quando tudo é novo e parece estranho, estes pequenos detalhes nos lembram do lar que somos e de que o essencial continua o mesmo. Minha filha se apegou ao boneco mais velhinho nos dias mais difíceis. Meu filho colocou seus pequenos tesouros em lugar de destaque. E assim, aos poucos, o velho e o novo se integram e tudo aos poucos se ajeita!
O que aprendemos no nosso processo de mudar de país com filhos!
Planejamento e organização dão muito trabalho. No entanto, fica muito mais fácil lidar com tudo isso num ambiente que a gente já conhece, do que enfrentar o caos da falta de organização, num ambiente novo, que já trará os seus próprios desafios.
Embora existam muitas incertezas no processo de mudança, nós podemos minimizar traumas criando uma estrutura com a qual os nossos filhos podem contar.
Saber que Deus está no controle de tudo, mesmo do que não sai conforme planejamos, também é uma lição que nos fortalece e da qual nosso filhos merecem fazer parte.
Espero que a nossa experiência familiar de mudança de cultura ajude o seu processo.
Qual o maior desafio que você está enfrentando no seu processo? Coloque as suas dúvidas nos comentários!
Se você já passou por isso, como foi o seu processo? Compartilhe as suas experiências e ajude outras mulheres a lidar com essa situação de forma mais leve e tranquila.
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Ler o relato da Michelli confirma para mim mais uma vez a importância do preparo para a mudança de país. O processo que a família fez foi intenso, e agora vocês estão colhendo os frutos deste investimento. Me sinto privilegiada e honrada pela confiança no meu trabalho e a possibilidade de compartilhar com vocês minha experiência. Abraços, Lea
Obrigada Lea! Seu suporte profissional fez toda a diferença. É realmente importantíssimo contar com uma rede de apoio, que é manifestação do cuidado de Deus por nós!
Ler seu relato me deixa encorajada e assustada. Não sonhava com a vida missionária, nem tivemos muito tempo para nos preparar como família para a mudança, isso me assusta. Algumas coisas que vc comentou ja estamos fazendo, ainda que seja bem mais difícil e caro incluir toda a família nas decisões que temos que fazer, e ver que não estamos tão errados, é um consolo.
Olá Arite, agradeço a sua contribuição. Seus sentimentos são muito válidos. É mesmo assustador por vezes. Mas o simples fato de pensar neste processo do ponto de vista dos filhos já fará toda diferença. Cada família também tens suas próprias experiência e aquilo que funciona no seu contexto. Siga firme! Deus é bom para nos guiar e orientar em todo este processo. Se não faltar amor e acolhimento na família, tudo acaba bem!
Arite Julia, quando saí pela primeira vez com filhos para o campo transcultural, não tinhamos acesso a grupos de apoio como o CMM, nem muitas irnformações sobre transição etc, mas o Senhor, em sua infinita misericórdia foi nos ensinando no caminho. E mesmo com minhas limitações, Ele nos deu graça. Hoje estamos pensando em mudar de país, e só de pensar me dá frio na barriga. Por que o novo sempre é assustador. Então, querida, ânimo, o Senhor está com você. Siga firme e adiante.